Couro de peixe leva rendimento sustentável para mulheres do litoral do Paraná

Couro de peixe já pronto para uso (crédito Diogo Cavazotti Aires)
Iguaria pode ser usada em peças de moda, arquitetura, design e artesanato
Em busca de materiais inovadores para produzir bolsas, a estilista Elyane Fiuza, de Curitiba, conheceu o couro de peixe. Esta novidade gerou uma coleção inteira de bolsas. “Eu queria algo diferente. Quando descobri que estas peças iam empoderar mulheres de Pontal do Paraná (PR), não tive dúvidas”, explica. A venda dos couros contribui para o rendimento de dezenas de famílias da região. Mas não é só no Paraná. O couro de peixe passou a ser produzido também no Rio Grande do Sul, Amazonas, São Paulo, entre outros estados.
Katia Kalko, professora do curso de Biologia da Universidade Estadual do Paraná (Unespar), explica que em 2004 uma ONG ministrou cursos de como curtir o couro de peixe no litoral do Paraná. Foi criado, então, um curtume comunitário. Entretanto, o método incluía formas abrasivas de curtir o couro. Foi quando Katia experimentou maneiras ecológicas de fazer o produto. Por lá já passaram diversos bolsistas da universidade e centenas de pessoas da comunidade. Atualmente são 17 mulheres que criaram duas associações.
Existem participantes que estão há mais de 10 anos no curtume de couro de peixe. Com o apoio da prefeitura (de diferentes partidos), do CNPq e da Fundação Araucária, novos equipamentos foram agregados ao espaço, necessários para a produção do couro, como tratamentos de resíduos e processos ecologicamente sustentáveis e menos poluentes. As peles sujas são adquiridas com os próprios pescadores, ao preço de R$ 5 a R$ 6 o quilo. São pagos mais R$ 7 para a limpeza das peças. O curtimento, conforme o número de itens, tem o preço de R$ 20. Todo o processo dura de 10 a 15 dias.
“90% do couro de boi é curtido com cromo (bastante químico)”, explica Katia. Diferente do couro de peixe, que utiliza de métodos naturais para ser curtido. “Toda pessoa que pega o couro de peixe coloca no nariz. Sim, ele não tem cheiro”, afirma a professora, que salienta: “nós fizemos análise de resistência e rasgamento. O robalo e o peixe amarelo têm qualidade superior ao couro de boi”.
Katia ainda diz que o impacto social influencia de forma positiva a produção do produto. “Quando as mulheres estão curtindo, conversam sobre as próprias vidas e problemas. Já sobre a parte monetária, existem rendimentos que variam de R$ 350 a R$ 3100 por mês, dependendo do desempenho individual de vendas. Ou elas vendem para artesanato ou disponibilizam para designers de moda e estilistas. Peças já foram vendidas até para a Alemanha”. O couro de peixe passou a ser buscado também em outras partes do Brasil, como Balneário Camboriú, Campo Largo e Brasília, para poltronas, detalhes, decoração e outros.
A presidente da Associação Couro de Peixe de Pontal do Paraná, Ana Maria de Oliveira Ferreira de Almeida, explica que elas são um grupo de mulheres que se reúne duas vezes por mês, em média, para a produção das peças. “Vendemos para artesãos, para a indústria do calçado, de bolsas e também usamos para a nossa própria produção de artesanato. A gente espera que o mercado reconheça cada vez mais o couro de peixe para a produção de materiais. Já socialmente é apaixonante. O trabalho vai além do social. É um produto que seria descartado e vira um material de primeira linha, economicamente viável e que reúne pessoas de culturas diferentes”, conta. Nos 14 anos em que ela trabalha com o couro de peixe, conta o prazer de ver o produto em uso: “orgulho, principalmente quando você olha em uma vitrine e reconhece o couro curtido por nós”.
A parte social também auxilia quem trabalha com o couro de peixe. Márcia Regina Balcezack Gimenez, vice-presidente da associação, passou por situações complexas no período em que trabalha com o curtume do couro de peixe. Perdeu o marido e posteriormente a filha. “O curtume me acolheu. É um local onde eu vou ou elas vêm me buscar para não me deixar sozinha. O curtume, pra mim, é a minha vida”.